quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Madalena.

Era treze de novembro quando Madalena me deixou. Treze de novembro, mês onze, de um ano muito atípico: 1984. Ou seja. Uma soma de horóscopo muito complicada. Juntando dia, mês e ano, mais Madalena e todas as mudanças que fez brotar, você contabiliza a quantidade de suspiros que levei pra começar a cicatrizá-la de minha vida.
Quando a conheci, descobri que eu mesma era outra pessoa. E fui engravidando de mim, dia após dia, sentimento este que Madalena trazia pra mim em todos os seus gestos de carinho ou não. Estar com ela me satisfazia de uma maneira que tudo no mundo, até eu, era melhor do que antes e do que todos os seres.
Mas aconteceu. Aconteceu dela de ser de sagitário. Este é o perigo das pessoas desse signo. Tão doces quanto perigosas, e por mais desgraças que Madalena fizesse em minha vida, tudo era reduzido ao pó quando me abraçava, e eu pensava ''nada me faria deixar esse calor''. E de fato, nunca nada fora capaz de me trazer a baila, se quer, esta hipótese desastrosa. Eu era Amélia, submissa, escrava eterna de qualquer situação que pudesse existir, só pra estar ao lado dela. O problema é justamente esse, Sagitário não vai embora, não se despede. Mas perde a frequencia, e aos poucos, Madá era só matéria perto de mim. Já jantou, não quer ir à praia, já viu todos os filmes da estante. E uma geladeira se transporta pro lado direito da cama. Até que você tem que deixar o sagitariano, porque ele não tem coragem de ir embora de fato.
Estive doente por ela todos esses anos, e sua partida não me matou, nem me curou, mas aumentou uma ferida que sempre existiu junto com o medo de perdê-la, uma verdadeira metástase. Até que hoje percebo que esse tanto amor que eu nutria não era exatamente por ela, e sim por quem eu era junto dela, e vi o que sou não partiu, junto com o princesa do agreste que a levou. Por bem.
Agora, ex cativo, vejo: que bom que partistes, ferrenha obsessão, triste de quem diz que o amor é cego, por que verdadeiramente o pior cego é este: o que não quer ver.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

O mundo inteiro de alguém.


Pra gente é só um buraquinho no chão, e pras formigas um universo inteiro. Quem garante que nós não somos um buraquinho no chão de alguém? quanta pretensão achar que o ser humano conhece o universo inteiro, né? e que ele se resume a nossa possibilidade de cognição.

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Fera

"Morena bela
Pra que ser tão bela assim?
Tanta beleza é ruim
Quem te vê se desespera
És uma fera
Não quero te ver jamais
Gente assim Deus é quem faz
E o Diabo é quem tempera

Ah, quem me dera
O teu beijo não ser doce
E se teu semblante fosse
Igual ao da besta- fera
Pura quimera
Morena do traço fino
Por azar do meu destino
Tu não és uma megera

Quem sou, quem era
Já brinquei Maracatu
Hoje eu sou um papa- angu
Com a cara de pantera
Quem te venera
No final fica perdido
Como um vulcão esquecido
No fundo de uma cratera

Olhando a esfera
A cigana me falou
Que se perdido eu estou
Meu destino não se altera
Carrego a fera
Que do céu já estou expulso
E hoje, nem que seja a pulso
Levo pra minha tapera"


Mestre Ambrósio - Terceiro Samba

quarta-feira, 15 de junho de 2011

Cavalo de Troia.

Outrora insinuaste ser nocivo à minha paz,

Idgnada, discordei.

Eras tu, minha paz.

Hoje proclamo:

És essencial a minha paz,

Mas não quando te fazes presente,

A presença de tua ausência,

Tem sido meu presente de paz.

O liame entre

A paz, ausência e presença,

Sutil se faz.

Do mesmo modo que

Nos perdemos entre o que de fato sentimos

E o que nosso imaginário afetivo e poético

Nos leva a crer que levamos dentro.

A distância entre fantasia, e amor carnal,

É a diferença entre a verdade e a mentira,

Depende apenas da ocasião, do interesse e do ponto de vista.


E da cara de pau de cada um...ou de sua competência pra artista. haha!

quinta-feira, 2 de junho de 2011

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Das refutações.

O que as coisas são
antes das coisas serem coisas,
pra gente?

o que é a gente
antes da gente
ser gente
e supor saber o que é,
gente?

o que são,
e o que é,
as coisas
e as gentes?

o que é que a gente sente
antes de saber o que é
s e n t i r,
s e r,
c o i s a,
g e n t e ?

aspiro ver o mundo com os olhos de
um menino
que nunca foi menino,
que nunca foi semente,
que nunca será gente,
nem agente,
nem coisa.

Dedicado a Ian Farias, que verá o mundo com os olhos do amor. Titia.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Protótipo poético de um adeus.

Um círculo

um ciclo

que abre-se

e fecha-se


Amor

ardor

a dor

adeus


O que de mim

morava em ti

bate a porta

e volta pra casa


Cria asas

pra fazer

de outra flor

nova morada.


sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Flores no semáforo.

Olhou o relógio: 16h10....16h10? Nunca havia olhado pro relógio às 16h10! sempre ás 16h, 16h15..mas não, dezesseis e dez, definitivamente, jamais! uma cidade, uma avenida, um mundo de pessoas e idéias transitando sem saber direito pra onde nem porque, apenas indo por dever ir, sem parar pra pensar no sentido que isso faz ou deixa de fazer...até porque se fosse assim...na cidade nem mais um passo.

Pra onde vai tanta gente?

estranhos enfileirados,

uns bem juntinhos dos outros,

se encarando por não haver fuga,

e almejando escapar pelas janelas,

pelo menos nos pensamentos e num pouco mais de ar.

Nenhum deles está ali. Estão ontem, estão na sexta-feira, nos braços de seus amores, ou brincando com seus filhos. Nenhum está sentado ou de pé num ônibus lotado às 16h10. Atropelando-se os pensamentos fluem e os sentimentos fogem. Os sentidos não, estes permanecem vivos: doem as pernas, doem as costas, o corpo pede por tudo um pouco de sossego. E a cabeça? corre bem mais que o fluxo da metrópole.

Pra onde vão todas essas pessoas no mesmo sentido sem sentido algum? enfileirados, seguindo o mesmo destino em viagens tão diferentes. Parecem ter tudo em comum, mas são meros desconhecidos se aturando no mesmo espaço físico numa temperatura típica de fim dos tempos. Como sobreviver com toda gentileza e poesia diante do caos? opressão, opressão. Parece que todos querem o mesmo, e porque, sendo tantos não conseguem? tão difícil prosseguir.

Pouco a pouco, todos os guerrilheiros urbanos serão substituídos...e o que é que vai ficar? poeira. O que fica é poeira, e todo o desgaste será em vão. E a vida? ninguém para pra pensar nela, apenas vai-se sobrevivendo. O que somos, sentimos? finalmente, porque? pra que? a placa diz que a rota é esta, mas onde levará as escolhas individuais que são cada dia mais individuais? o que é uma sociedade evoluída? passar pelas ruas e ver rostos embaçados e pessoas sem nome? Caríssimos, os grandes dizem que a cidade parada tornará o mundo um caos. Mentira, se parássemos pra escutar o coração bater e o ar entrar e sair dos pulmões, se parássemos de correr só pra pensar no porque e pra onde corremos... a vida é um minuto dentro da explosão cósmica, somos meras formiguinhas inventando regras e necessidade. Parados... e a cidade florirá, voará!

Ps: viver é sonhar,

sonhar é florir por dentro,

e extrair do trânsito poesia...

sábado, 1 de janeiro de 2011

Nem verso, nem reverso, nem inverso.

Não tem métrica,
não tem forma pré-definida:
é ressonância aleatória
de vibração de cachoeira
que se soma a águas outras;
nascente todo dia.
Do fluxo
que se faz;
da permissão da geografia,
seu desenho.
Não para a nascente, de nascer,
não pede licença para isso:
movimento é sua vida.
Ainda que a geografia
escolha seu desenho,
será sempre
vibração aleatória,
ressonância de cachoeira,
fluxo do que nasce todo dia.
Incondicionalmente.